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A Emoção da Arte

  • relyjae
  • 27 de jun. de 2020
  • 4 min de leitura

Atualizado: 30 de abr. de 2022

“Arte é o fluir, o sentir com todos os sentidos. Abrir-se a uma emoção maior. Transparecer o ser: sou eu, é você, somos. A luz que a todos toca na sua imensidão. É ver e enxergar sem precisar provar a não ser por ela mesma”. (Regina Lydia)

 

Escrevi esta definição de Arte há muitos anos e agora a encontrei num bloco de notas. Pena que estava sem a data. Gosto de comparar a escrita através do tempo. Tem coisas que a gente escreve que vamos ler anos depois e não concordamos mais, ou achamos até uma bobagem. Com esta ainda concordo e me fez lembrar as emoções que a Arte nos provoca.


A Arte é uma paixão para muitos e sua fruição causa uma variedade de emoções e sensações. Primeiro suas imagens, cores e formas atraem nosso olhar e na sequência nos tocam a mente e a alma. O resultado pode ser agradável, desagradável e raramente, indiferente. Na arte moderna a beleza ganhou outro status, não precisa mais ser “bonita” nem “perfeita”, mas despertar sentimentos seja de prazer ou desprazer: desacomodar e incomodar para levar a reflexão. Este impacto pode se tornar mais forte conforme a sensibilidade de cada um.


Stendhal (1783-1842), escritor francês, ao visitar a Basílica de Santa Cruz em Florença, sentiu uma emoção tão forte ao ver os afrescos de Giotto e de estar junto aos túmulos de ícones italianos, como Michelangelo, Dante, Galileu, que entrou em uma espécie de êxtase e teve que sair para se recuperar:

Tinha chegado ao ponto da emoção onde se encontram as sensações celestes proporcionadas pelas belas-artes e os sentimentos passionais. Saindo de Santa Croce, meu coração batia forte, o que em Berlim chama-se "nervos"; a vida esgotara-se em mim, eu andava com medo de cair...” STENDHAL (Nápoles e Florença: Uma viagem de Milão a Reggio - 1817).

Este aturdimento ficou conhecido um século e meio depois por “Síndrome de Stendhal”.


Confesso que tive esta mesma sensação algumas vezes ao me deparar com obras de arte famosas: batimentos cardíacos acelerados, vertigem, arrepios e lágrimas. Em Florença, lembro-me de meu encontro com o David de Michelangelo*, na Galleria dell’Accademia... Indescritível! Senti tudo isso e não conseguia parar de olhar. Quem já foi a Florença sabe como é difícil não se emocionar com tamanha imersão na história da Arte. São muitas obras de Arte extraordinárias juntas! Eu sempre dizia aos meus filhos que não podia morrer antes de ir a Florença. Foi um dos lugares mais incríveis que já visitei. Agora preciso retornar e ficar um tempo curtindo suas belezas aos poucos, deixar fluir e sentir. Se tiver a Síndrome de Stendhal na sua forma mais grave, estarei no lugar certo, lá existe o único serviço de psiquiatria especializado na doença. Mas espero não precisar...


Florença por ser a capital da Arte no mundo é considerada cidade-tesouro por sua belíssima arquitetura e concentração de obras de arte renascentistas. Recebe milhares de turistas, amantes e estudiosos das artes, tornando-se assim um lugar propício para desencadear a Síndrome de Stendhal. Foi somente em 1979 que a doença foi descrita e nomeada pela psiquiatra Graziella Magherini, autora do livro “A Síndrome de Stendhal: o Mal-Estar do Viajante Diante da Grandeza da Arte”. Como diretora do departamento de Saúde Mental do Ospedale Santa Maria Nuova, observava que muitos turistas com maior sensibilidade emocional eram acometidos por um transtorno psíquico repentino com sintomas comuns: taquicardia, dispneia e vertigem, que podiam durar momentos ou até diversos dias. Alguns apresentavam uma forma mais grave e chegavam a se perder na cidade, com alucinações, desequilíbrio e alteração da percepção e precisavam ser hospitalizados. É o único hospital no mundo especializado neste transtorno, também conhecido como Síndrome de Firenze ou Síndrome da Sobre Dose de Beleza.


Um detalhe interessante é que ela só acomete estrangeiros. Os italianos são imunes por conviverem desde o nascimento em meio a obras de arte , não se surpreendendo mais. Numa visita a Itália, ouvi algo semelhante de um amigo italiano quando me viu boquiaberta diante de uma Igreja em sua cidade. Ele disse que desde criança jogava futebol no pátio de igrejas como aquela e para ele aquilo era algo natural. Nós que viemos do Novo Mundo, ainda nos impressionamos com tanta antiguidade, afinal antes do Brasil ser descoberto Florença já estava no seu auge, onde Leonardo da Vinci, Michelangelo e vários outros mestres criavam suas obras imortais.


Pena que as pessoas em geral não se dão conta do grande valor da Arte. Ela que esteve presente desde a pré-história revelando como o homem foi se desenvolvendo ao longo dos tempos, que foi primordial na construção das cidades, na cultura dos povos. Sem ela o mundo seria muito sem graça. E apesar de estar em constante transformação, acompanhando as mudanças de cada década, se reinventando, tomando novas formas, seu legado é eterno e seus ícones serão sempre apreciados.


Homem e Arte formam uma simbiose indissociável.

É por isso que a Arte é fundamental, sempre foi e sempre será!

*Até 1910 ele ficava a céu aberto na Piazza dela Signoria, mas foi transferido para a Galeria da Academia de Belas Artes para evitar sua deterioração. O David que atualmente vemos praça é uma cópia do original. Ainda tem outra cópia, mas em bronze, na Piazzale Michelangelo, nos altos de Florença, onde se vê a vista do rio Arno e da cidade.



5 Comments


malicestrella
malicestrella
Jul 11, 2020

Amei, amei cada palavra! Revisitei Florença com tuas descrições, enriquecidas pelas tuas impressões! Toque de almas!

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relyjae
Jun 30, 2020

Gostei da comparação do sistema nervoso emocional como um instrumento que os artistas sabem tocar! 👏👏👏

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Rubens Mazzini
Rubens Mazzini
Jun 30, 2020

Essa síndrome só ocorre em pessoas que possuem um nível elevado de sensibilidade em geral e, em especial, para apreciar a beleza das obras se arte. Da mesma forma que algumas pessoas sentem um arrepio e outros sintomas físicos e emocionais semelhantes ao transe quando ouvem um peça musical que as toca profundamente. A arte tem esse poder de tocar profundamente nossas emoções e somente os grandes artistas, dotados de uma sensibilidade e talento extraordinário, tem esse dom de criar obras capazes de causar esse efeito. É como se o nosso sistema nervoso emocional fosse um instrumento que os artistas sabem tocar, como um músico que sabe tocar um instrumento para tirar dele os sons mais sublimes.

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simone63barros
simone63barros
Jun 29, 2020

Bah Regina, tive esta síndrome em Barcelona. Foi difícil controlar. Nunca vou esquecer.

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claudio.mazzini
Jun 28, 2020

Em 2011 ,casualmente, nos encontramos lá. Realmente um verdadeiro museu a céu aberto!

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